Liceu Salazar de Lourenço Marques - entrada e frente (1/8)

O Liceu Salazar de Lourenço Marques é a actual Escola Secundária Josina de Maputo. Tendo sido considerado o melhor liceu do espaço português quando foi construído no início dos anos 50, há muita informação oficial e privada sobre ele e sumarizo a que me parece mais relevante em três mensagens. 
O arq. Renga Ferreira cobre com detalhe esta construção projectada pelo Arq. José Costa e Silva nas páginas de 142 da 148 sua dissertação de mestrado (pdf carregável aqui) intitulada OBRAS PÚBLICAS EM MOÇAMBIQUE, Inventário da produção arquitectónica executada entre 1933 e 1961. Usarei aqui umas partes.
A arq. Zara Ferreira, seguindo em parte o trabalho de Renga Ferreira, no artigo no HPIP mostrado mais completo em baixo conclui que este liceu tinha a aparência típica das obras do Estado Novo mas que no projecto foram utilizadas técnicas e materiais de construção actuais e que foi tomado em consideração o clima local de forma pioneira. É sua convicção que se criou neste projecto feito na "Metrópole" o modelo que veio a ser adoptado localmente pelo arq. Fernando Mesquita das Obras Públicas para as escolas dos anos 60/70, caracterizado por salas de aula de um lado viradas para o exterior e do outro protegidas da luz, calor e chuva por amplas "varandas" e por módulos de diferentes usos dispostos ortogonalmente com galerias de ligação.
Quanto a fotos, faço aqui principalmente a selecção das conhecidas de melhor qualidade, de algumas menos conhecidas e de mais antigas reproduzidas do Documentário Trimestral e haverá um par da "colecção" do HoM.
Nesta mensagem temos fotos do pátio, da entrada e do resto da frente do Liceu virada para a Av. Brito Camacho, actual Lumumba. Essas são todas anteriores à independência de Moçambique mas há uma do interior mais recente.
Pátio principal com a estátua de Salazar e o pórtico monumental de acesso ao fundo
Segundo Renga Faria estéticamente o desenho era racionalista reduzindo-se quase exclusivamente à essencialidade dos elementos estruturais, com excepção do pórtico e átrio. O pátio da entrada principal visto em cima era quadrado com cerca de 60 metros de lado, com pavimento ajardinado e espelhos de água.
Portão de entrada principal pela Av. Brito Camacho cerca de 1970.
O edifício desdobrava-se simétricamente em torno deste este eixo
Átrio revestido a mármore, parcialmente colocado 
sob o volume do pórtico de acesso (foto Renga Ferreira c. 2005)
Passamos para fotos exteriores de dois corpos com salas de aula (o tamanho variava entre salas normais, de desenho e trabalhos manuais e laboratórios) colocados próximo da Av. Brito Camacho e virados a sul, para a Barreira da Maxaquene e para a Catembe. As fotos são de 1955 e foram tiradas aproximadamente para leste. 
Vê-se a entrada principal entre os dois corpos simétricos.
Era a fachada que recebia sol à tarde e estava protegida pelas galerias.
Mesma direcção da foto de cima com o portão de entrada principal mais próximo.
Ao fundo à esquerda vê-se uma das galerias de ligação entre os corpos de salas de aulas e o corpo da fachada principal que tinha o átrio de entrada e por exemplo a secretaria. No terceiro piso a galeria está livre mas nos dois primeiros está encostada a uma construção que do lado oposto ocupa parte dos pátios interiores (desconheço detalhes de utilização).
Para terminar uma foto tirada na mesma Av. Brito Camacho das duas fotos anteriores, mas depois de se ter passado o portão de entrada principal caminhando em direcção à praceta do Infante D. Henrique e à Ponta Vermelha.
Vê-se mais próximo o corpo de salas de aula do lado nascente = leste,
à sua esquerda o portão de entrada principal e depois o outro corpo simétrico
Seguir-se-à um artigo com fotos mais antigas.
Resumo do artigo da arquitecta Zara Ferreira para o HPIP - Liceu Nacional Salazar (LS), Equipamentos e infraestruturas, baseando-se também no Boletim Geral do Ultramar, nºs 329 e 345 de 1952 e 1954.
O LS foi o primeiro grande liceu a ser construído na capital de Moçambique, entre 1945 e 1952. O projecto, de 1939, foi desenvolvido em Lisboa, Portugal, pelo arquitecto José Costa e Silva (1911-), funcionário da Junta das Construções para o Ensino Técnico e Secundário (JCETS).
A expressão de monumentalidade é evidente na escala e no rigor de simetria compositiva do edifício, tendo sido considerado, nos anos 50, “a mais vasta e imponente construção para o ensino liceal, não só das Províncias Ultramarinas portuguesas, como de todo o território nacional. E [era] de crer que [fosse] das maiores do Mundo”. 
Para se compreender o poder evocativo do regime representado neste Liceu, especialmente proclamado no patrono que lhe deu o nome – António de Oliveira Salazar – e a sua capacidade de representação da almejada ideia de progresso, leia-se a descrição entusiasmada de um periódico datado do seu momento inaugural: “Quando há oito anos vimos lançar os fundamentos do edifício que hoje se ergue majestoso quase sobre a baía, pensámos que alguma coisa de grande havia de surgir, digna de uma cidade que a merece. Ampla entrada, amplo pátio, no meio do qual a estátua do patrono do Liceu Salazar, solene no seu trajo de catedrático, dá ao ambiente uma majestade igual à que envolve toda a sua figura de homem da Nação. Em toda a volta pátios de recreio com campos de jogos feitos e apetrechados a preceito. Escadarias de mármore – “mármores nacionais expressamente vindos da Mãe-Pátria para enriquecer o mais belo, maior e melhor estabelecimento de ensino secundário do Império Português” – corredores, campainhas, telefones, relógios. Um dédalo que se há-de tornar fami­liar a professores e alunos. Respira-se um ar de limpeza; entra a luz a jorros; parece que estamos na rua. E as salas sucedem-se claras, arejadas […]. Extensa área coberta, vastos corpos do edifício, salões de festas, salões de jogos, ginásios, salões de estar, biblioteca, piscina com dimensões olímpicas, balneários ricos de mármores, aparelhagem de ar condicionado, de filtragem de água, de projecção de filmes, cenários para teatro, camarins, maquinaria própria para trabalhos manuais, tudo quanto de moderno se pode encontrar – garantia se­gura de que o Estado pensa na educação da sua juventude, no futuro dos filhos dos seus cidadãos.”
A monumentalidade como instrumento essencial de propaganda do Estado Novo está claramente presente ao longo dos seus 9.201 m2 de área coberta distribuídos pelos seus 29.000 m2 de recinto, organizados com base numa rigorosa simetria axial, ainda ligada ao sistema das Beaux-Arts. Porém, esta obra marca um momento de viragem que não pode ser ignorado na história da construção escolar nas colónias africanas. No LS o discurso conservador é totalmente abolido para dar lugar “à técnica da construção da época em toda a sua exuberância”. 
O betão armado assumiu o seu potencial técnico e estético, contribuindo para um resultado totalmente inovador, nas construções escolares da colónia, pela escala e pela racionalidade construtiva, reduzida quase exclusivamente à essencialidade dos seus elementos estruturais. A utilização dos novos materiais de construção aliada à cumplicidade do discurso vai tornar óbvia a identificação deste tipo de construção com a modernidade. Mais do que isso, marca finalmente o início de um discurso que articula directamente a concepção arquitectónica com as condicionantes locais impostas pelo clima: a arquitectura escolar moderna em Moçambique, voltando-se para o exterior, vai, a partir deste momento, conceber os espaços, e em particular as salas de aula, em compartimentos únicos entre fachadas opostas em contacto directo com o exterior. Nelas vão-se abrir grandes vãos, permitindo a ventilação natural permanente e a entrada de uma iluminação bilateral. Estes vão estar permanentemente protegidos pelas enormes galerias de circulação exteriores cobertas que asseguram o acesso, o sombreamento constante e a defesa das chuvas. A construção elevada a 1 m do solo para combater a humidade por ele transmitida e a concepção da cobertura, agora plana, conjugada com o declive necessário ao escoamento das águas, em betão armado e com uma caixa-de-ar intermédia totalmente ventilada são também particularidades que exemplificam a adaptação da construção ao clima tropical patente nesta escola.
(Referência FCT: PTDC/AUR-AQI/103229/2008)

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